"Ressuscite-me", por favor!
E quando a Vida se esvazia de um tanto que só a Morte é capaz de preenchê-la? Ou seria a Morte não exatamente um preenchimento, mas uma redenção, o fim de um vazio que dói?
O filme "Mate-me, por favor" ilustra perfeitamente esse vazio onde a Morte tem mas significado e conteúdo que a Vida. Ambientado no bairro da Barra da Tijuca, entre prédios imensos que circundam matas ermas e trilhas quase sinistras, a película se foca em Bia (Valentina Herszage), uma adolescente de 15 anos, seu irmão João (Bernardo Marinho), de 25; e alguns amigos dela. Os pais são ausentes, assim como professores e demais adultos-guias. De liderança, apenas outra adolescente, a pastora da célula religiosa frequentada por eles. Sexo, palavra de Deus, festas luxuosas e assassinatos misteriosos compõem o enredo que mostra fidedignamente os conflitos que ditam o crescimento, a mudança de fase; e o quanto essa geração que tem acesso a tudo na palma da mão, literalmente, não sabe como lidar com isso, e se vê cada vez mais perdida do que encontrada.
Com poucos diálogos, e muitas cenas escuras ou manchadas de sangue, a autora e diretora Anita Rocha da Silveira narra a obsessão de Bia pela Morte, começando com a notícia de que fora encontrado, no caminho da escola, o corpo de uma jovem; e culminando quando ela e as amigas encontram uma vítima agonizante, que morre bem diante dela. Bia se revesa então entre a vontade de matar com a vontade de morrer. Ora fere as amigas, ora vaga pela noite na esperança de ser a próxima na trágica estatística. "Sangue é vida" é uma das poucas frases proferidas pela jovem, que em sua maioria está calada e com olhar fixo e divagante, seja vazio ou preenchido com sua obsessão, que pareceu eleger Augusto dos Anjos como ídolo norteador.
Os assassinatos - quem os cometeu, e por quê - acabam sendo esquecidos em tantos momentos, e o melhor é que o filme indica, mas não os resolve. Roteiros abertos estão sendo cada vez mais comuns. O público pouco a pouco vai se habituando a um cinema mais próximos à realidade, onde as coisas não acabam antes dos créditos subirem na tela. E ter um elenco basicamente composto por atores e atrizes em sua maioria desconhecidos e inexperientes traz uma quebra de expectativas que faz com que a história flua ainda melhor.
A última e mais emblemática cena demonstra que esse é um thriller muito mais psicológico-comportamental do que propriamente um terror-suspense adolescente, e isso até pode frustrar um ou outro espectador. Mas aquele que aceitar mergulhar na psiquê perturbada de Bia não poderá dizer que saiu do cinema sem experienciar a tensão, a dúvida e acima de tudo o Medo.
"Mate-me, por favor!" realça os ineditismos tão necessários num mundo praticamente assassinado por clichês.
Maria Eduarda Novaes
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