terça-feira, 8 de dezembro de 2015

CHICO - Suprassumo Brasileiro




Nós Poetas somos atemporais. Aliás, não só não temos idade, como não temos sexo, não temos gênero, nem muito menos algemas, só asas. Prova disso é que Chico Buarque representa a minha infância, adolescência e juventude, sua inspiração assina a co-autoria de cada poema de Amor que escrevi, e isso sem eu estar perto de ser sua contemporânea. 34 anos afastam nosso nascimentos, mas seus 50 anos de carreira cabem em qualquer fatia de Tempo da Vida de qualquer um.

Segundo minha mãe, eu nasci com "os olhos do Chico". Foi o que ela afirmou tão logo me viu, fazendo brotar em meu pai um certo "pedido de explicação". Nasci com seus olhos, e fui recebendo todo o resto pelos ouvidos até que, enfim, adotei sua mesma mania de brincar com as Palavras e os Papéis (num outro nível de competência e dimensão, obviamente). Mas não daria mesmo pra ser diferente: era Os Saltimbancos na hora da papinha, era um passeio pra ver A Banda passar, era um brincar diário de Quem te viu, quem te vê na frente do espelho, e ainda ver minha irmã mais velha crescendo ao som de Essa Moça Tá Diferente. Era sair com toda a família a distribuir cobertores e sopas àquela Gente humilde, era uma Valsinha divertida com o papai pra matar a saudade quando ele chegava do trabalho, e um Acalanto garantido na hora de dormir... Assim se deu a Construção da Poeta que sou hoje! Melhor dizendo, ainda se dá. É um Cordão Cotidiano que nunca haverá de se romper. Uma Tatuagem que me dá coragem pra seguir viagem de dia e de noite, neste ano e no que vem. 




Em abril, presenteei a mim e a minha mãe com a ida a SP para ver o espetáculo Todos os Musicais de Chico Buarque em 90 minutos - peça criada em homenagem aos seus 70, completados no ano passado. Queria agradecê-la à altura por ter me inundado com esse Universo, proporcionando a nós duas uma noite especial. E quando eu achei que conhecia muito da obra desse gênio, vi que conhecia quase nada! Quando achei que seria uma noite de nostalgia, me vi numa noite de aprendizado. Senti que ainda precisava viver umas duas encarnações no mínimo pra conseguir conhecer toda sua obra, da primeira à última palavra. 


Mas com o filme Chico - Artista Brasileiro, não consegui fazer o mesmo, e assistir ao lado dela. Pelo menos, graças a Deus, vi ao lado de duas pessoas que entendiam perfeitamente a dimensão daquele filme pra mim, e estávamos todas na mesma "vibe". Mentalizava minha mãe o tempo todo, sentia até o cheiro da nossa casa da QI 27, me fazendo crer que não estava em uma sala de cinema, mas sim, na sala de casa, recebendo Chico e seus amigos como visita. E essa sensação de que somos um grupo só, e atemporais, ficou evidentemente Clara quando ela mesma cantou ao lado de seu avô, acompanhada do irmão e da prima. 3 gerações - a do Chico, a minha e de seus netos - cabiam num mesmo Espaço, numa mesma fatia de Tempo. Assim como coube ainda a voz de Marília Pera (nos confirmando sua imortalidade), que nos carregou a conhecer o Buarque Alemão; e couberam também tantos estupendos intérpretes que permearam o enredo, com destaque pra Laila Garin, cantando A Canção Desnaturada de uma forma bárbara, sim, mas em nada desumana - muito pelo contrário!


Chico diz que não é Poeta. Se ele não é, então ninguém mais pode ser (muito menos eu!). Mas entre ele dizer que não é Poeta e de fato não ser um há uma distância abissal. Porque ele é sim, e o melhor entre os melhores. Ele é plural porque é Poeta, é letrista, é músico, autor teatral, romancista, pai, avô, filho e irmão até de um alemão. É plural porque é Chico, é Tom, Vinícius, Edu, Toquinho... É plural porque está em si, e ainda em Caetano, em Betânia, em Ney Matogrosso, Mônica Salmaso, Adriana Calcanhoto, Mart´nália, e até em Carminho, do outro lado do oceano. 

Miguel Faria Jr., assim como em Vinícius, fez o melhor serviço ao público que podia fazer: mostrar e exaltar um verdadeiro artista. Alguém que não se contaminou pela fama, pelo dinheiro, e que apesar de já ter feito tanto, é consciente de que a Vida não pára, e que os desafios são uma importante força motriz. Um verdadeiro artista que tem consciência do poder transformador de sua Arte, e a usa sem moderação, sem medo de preconceitos, censuras, nem de exílio.

E quem tem vontade de sair do exílio poético, e ainda aqueles que nem imaginam estar em exílio sentimental, a porta de saída é a porta de entrada do cinema mais próximo de você. 


Aproveite essa fonte de Luz 
Que mora nos olhos azuis
Que rima com tudo que se estima
Obra-prima que a todos se destina
E em qualquer Língua se traduz!