quarta-feira, 18 de novembro de 2009

"DESISTIR DA VIDA"

É com dor no coração que faço essa crítica. Sou verdadeiramente fã de Manoel Carlos e seus folhetins, mas dessa vez não sei o que houve, mas meu querido Maneco errou na mão. 'Viver a Vida' parece que ainda não disse a que veio, mesmo com o prometido acidente/enredo base da história já presente. Todas as novelas dele superam expectativas. Seus anúncios antes da estréia já causam alvoroço. E os primeiros capítulo, então?! São de causar "frisson". Em 'Viver a Vida', a primeira Helena negra e de 30 anos já prometia. Seria um "a mais" para levantar a história, pois as quarentonas de classe média alta anteriores já estavam mesmo meio batidas. Mas a Helena de Taís Araújo esta mais para uma coadjuvante do que para protagonista, heroína. Pensei que se eu, que como atriz e escritora há anos sonho em trabalhar com esse titã da teledramaturgia, não estava nada empolgada com a novela, o que estariam pensando os reles mortais?! O pior! O público pede a morte de Helena - justo dela - e o Ministério Público começa a ameaçar tirar do ar a atriz mirim Klara Castanho, a Rafaela, filha da personagem Dora, vivida por Giovanna Antonelli. Isso porque a criança está descrita e planejada para ser perversa e levará a mãe na aba de suas tramóias - mas, vamos combinar que a mãe também está longe de ser um bom exemplo para a menina. E o MP não aceita ver uma criança de má índole sendo mostrada em horário nobre como exemplo (embora eu pense que sejam poucas as crianças dessa idade que de fato estarão assistindo a novela e se influenciando, mas a queixa é válida). Até agora, todos os diálogos apresentados são fracos, sem metade da profundidade a qual estamos acostumados a receber do autor. Cenas longas que, ao espremer, não sai nada. Um exagero de paisagens - ainda que sejam paisagens exuberantes - que chegam a levar quase uma musica inteira. Isso é novela ou uma seção de clipes da MTV? As personagens de Alinne Moraes e Bárbara Paz são ao mesmo tempo que o ponto alto da trama, o mais irritante. Suas personagens beiram o insuportável (mérito para as atrizes e suas atuações estrelares). Além disso, outras grandes estrelas estão desperdiçadas em papéis rasos, como Lília Cabral e Natália do Valle. Pelo menos Matheus Solano, que interpreta os gêmeos, aparece como a tábua de salvação da novela. A atuação do ator é tão exemplar que os gêmeos chegam a parecer fisicamente diferentes. Mas sua escalação para o papel, infelizmente, não foi uma regra, mas a exceção. Daniele Suzuki e Max Fercondini nem cara de adulto têm, quanto mais de médico. Não convencem de jeito nenhum. Chega beirar o ridículo, o canastrão mesmo. Nenhum dos núcleos mostra estar perto de se aprofundar, quando já não é sem tempo de estarem mais que definidos. Helena, por exemplo, não mostra nenhum de seus lados com mais ênfase. A personagem de Camila Morgado, a jornalista de economia, do primeiro capitulo que apareceu até o anterior ao seu desaparecimento súbito, era um tapa buraco dos mais clichês. Essa coisa do "também morro de tesão por você, então vamos transar feito coelhos debaixo do nariz da sua mulher sem que ela nem desconfie" já deu o que tinha que dar. Esse tipo de infidelidade já não "a trai" mais. Tudo é bastante superficial por todos os lados, principalmente no meio dos protagonistas. A impressão que dá é que alguém resolveu fazer um reality show da vida de algumas famílias, filmando suas rotinas, mostrando suas visões de mundo e opiniões, mas escolheram as famílias mais "sem sal" do planeta. A novela dá sono, cansa, enrola como se estivesse já no final. Foram quase 15 capítulos na viagem até o acidente enfim acontecer. Ou seja, há pelo menos meio mês que vemos, incessantemente, Helena se debulhando em lágrimas - com o ápice no capítulo de 16/nov, quando ela se ajoelhou diante de Thereza pedindo perdão, e levando uma bofetada. Sei que uma novela de Manoel Carlos não sairá do ar antes do previsto por estar com IBOPE bem mais baixo que o normal, mas é bom que sofra rapidamente uma mudança de, no mínimo, 180 graus, para ao menos se parecer com uma obra Manequinesca. Por hora, penso apenas que se a Helena fosse na verdade a Luciana, a coisa faria mais sentido...

domingo, 15 de novembro de 2009

"Diga-me o que vestes, que te direis quem és,
e se devou o não andar ao seu lado..."
Nos últimos dias, dois fatos se destacaram na mídia, mas somente um foi levado a fundo, enquanto o outro já caiu no esquecimento. Como sempre, por aqui, o que deveria ser discutido é o que se esqueceu, e vice-versa.

Caetano Veloso esbravejou contra o Presidente Lula, chamando-o de "analfabeto", e dizendo que ele é "uma vergonha para o país". Na hora, me perguntei 2 coisas: 1a - será que um letrado do nível de Caetano até hoje não sabe o significado da palavra "analfabeto"? 2a - será que um letrado do nível de Caetano acha que os analfabetos assim são por opção de vida, e, por isso, devem ser xingados e taxados de "vergonha" ? Lamentável ver que alguém que teve oportunidades na vida não seja capaz de reconhecer que os demais abaixo dele só estão ali porque não tiveram as mesmas oportunidades. Lamentável ver o preconceito puro - com pedigree - de um letrado, sua ira por estar sendo governado por alguém que, mesmo com muito menos oportunidades que ele, chegou bem mais alto, onde ele nunca esteve nem perto.

A declaração de Caetano, essa sim, deveria ter ganho a mídia maciçamente, e não o caso da estudante do vestido inadequado. Mas chamar o Presidente da República de analfabeto, isso não é tão grave. Grave mesmo é ridicularizar uma coitadinha de uma estudante universitária que não concorda com uma regra, não acha que deva seguí-la, e como principal argumento para essa transgressão manda o velho equivoco semântico: "vivo numa DEMOCRACIA". Assim sendo, vamos ao esclarecimento do século: DEMOCRACIA não tem nada a ver com liberdade total, oba-oba, passe livre pra agirmos como bem quisermos. DEMOCRACIA não é bagunça! Significa "governo do povo", onde a maioria dita as regras. Isso mesmo, regras. Todo e qualquer governo, em todo e qualquer lugar, as tem. E até podem ser contestadas, discutidas, mudadas, mas enquanto vigorarem, são para serem seguidas. DEMOCRACIA não é a desculpa perfeita para agirmos conforme nossa própria vontade.

Uma das regras que a sociedade criou é justamente o "vestir-se". A vestimenta é um traço social claro, algo que rotula, que separa em grupos, define a origem e o destino, o cargo, a função. A roupa diz praticamente tudo sobre nós. Uniformes não foram criados à toa. E uniformes têm significado único. Médico, Polícia, Jóquei, Bombeiro, Salva-Vida, Aeromoça, Prostituta... "Diga-me o que vestes, que te direi quem és, e se devo ou não andar ao seu lado"...

Todo mundo sabe que numa igreja não se entra com decotes, ou de biquini; que não se usa terno e gravata num clube, que não se usa saia justa e salto alto numa academia de ginástica, e que não se vai à aula de piano com aparato de mergulho. Alguns desses casos são por pura lógica; outras, por convenção; e outras, por questão de ordem. Da mesma forma não se usa roupas provocantes em uma instituição de ensino, e vir depois dizer que não compreende a reação dos demais, chamando-os de hipócritas. Hipócritas? Só vi esta moça vestida-pra-matar, e não os que a apedrejavam de palavras duras. Se essa moça tentasse entrar em um Fórum com o mesmo vestido, seria barrada, mesmo vivendo em uma democracia. Se tentasse entrar em uma igreja, seria repreendida, e talvez até barrada, mesmo vivendo em uma democracia. Se tentasse entrar em inúmeras repartições públicas brasileiras, perigo não ter a chance de chegar nem à recepção para mostrar seus documentos, mesmo vivendo em uma democracia.

No programa Altas Horas, a jovem só fazia reclamar, entre jargões batidos que ela mal conseguia repetir tamanha escassez vocabular; que fora humilhada e discriminada. Engraçado que, por ninguém, ela foi chamada de "analfabeta", mesmo não conseguindo falar uma única frase sem cometer erros gramaticais gritantes que provavam que ela não deve ler um gibi sequer. Os alunos da faculdade e mais a platéia do programa discordavam de sua postura, a criticavam muito, mas quanto mais o faziam, mais davam a ela o que ela tanto queria: atenção e exposição. Afinal, se ela não quisesse se expor, estaria "uniformizada" em vez de se destacar da multidão. Ela sabia que causaria polêmica. Desde o episódio, foram tantas participações em jornais, programas de auditório, convites para revistas masculinas, e, obviamente, comunidades no orkut, twitter e afins. Só me falta fazer anúncio de O.B (sim, pois já que o comprimento daquele vestido mostrava até a cordinha do O.B, por que não aproveitar a onda?).

No fim, deixa eu ver se entendi direito: humilhar e discriminar o Presidente da República, pode; mas humilhar e discriminar uma pobre universitária por vestir-se inadequadamente, é um absurdo, e deve ser discutido à exaustão! É isso mesmo? Porque, se for, tomo pra mim por inteiro parte da fala de Caetano: "é uma vergonha para o país"...