terça-feira, 20 de novembro de 2012

MEUS SAPATOS VELHOS




Um dia, pus-me a pensar em quantos pares de sapatos já tive, e por quais razões já não os tenho mais... Pés que cresceram? Desgaste natural? Esquecimento inocente, ou raiva repentina que me fez lançá-los longe? Roubos ou doações? Impossível saber quantos sapatos já tive simplesmente porque incontáveis são os passos que já dei... 

Mas de um ou outro, a gente inevitavelmente se lembra. Como dos meus sapatos vermelhos com laço preto aveludado e desenhos de joaninha, por exemplo. Estes foram comigo à escola pela primeira vez. Conhecemos juntos as letras, levamos pisões pesados nos recreios, e eles aguentaram firme até as férias de julho, pois para lá já não dava mais pra irem... Lembro-me também das botas de chuva cor-de-rosa, de vinil. Caminharam comigo por quase 9 meses dos meus 12 anos, quando tão friamente foram jogadas fora porque não chamavam mais a atenção (inacreditavelmente), não eram mais novidade. Vejo que por elas não tive o menor respeito, a mínima estima. E sei que não foram as únicas a sofrerem tal desprezo, pois tantos outros pares tiveram o mesmo início e o mesmo fim. Pior: passaram sem que eu sequer me lembre de suas cores, modelos, detalhe algum... Um pouco mais tarde, na adolescência, lembro-me bem do par de tênis Nike de cano longo, presente dos meus avós. Estes foram embora por velhice. Meus pés já não cresciam mais, então, puderam ser guardados e resguardados por essa dupla enquanto outra parte minha - a alma - crescia sem parar. Enquanto amigos vinham e iam, eles foram ficando. Eram os únicos amigos que eu considerava eternos, sim, porque não foram eternos enquanto duraram, apenas. Foi duro substituí-los, pois via isso como uma traição. Foi com eles que vivi a primeira grande brincadeira de colégio, que era a de batizar os tênis novos e chiques com pisões lameados para carimbar as solas alheias. Eles não se importavam com isso, desde que fosse para me verem feliz, como "igual", como parte de um todo. Eles sabiam o quanto isso era importante pra mim. Mas importantes, mesmo, são eles. 

Os sapatos são especiais na nossa vida, são notáveis na grande maioria das vezes, e denotam a minha, a sua, a nossa personalidade, e tantas vezes a nossa classe social. Sapatos já se tornaram roteiro de filme premiado, já quase acertaram a cara de um presidente. Sapatos nasceram quase 10 mil anos antes de Cristo... Sapatos são um retrato dos passos que a gente já deu, para que a gente sempre saiba por onde passou e o que deixou pra trás. 

Maria Eduarda Novaes - 20/11/2012